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Ao longo dos próximos dez anos, a matriz de transportes nacional deverá ter custos mais baixos e um menor peso das rodovias na circulação das cargas, com acréscimo da participação da navegação de cabotagem e das ferrovias. Mas, para que os resultados sejam persistentes, será preciso avançar na atração do capital privado e superar gargalos em cada um dos segmentos, o que exigirá planejamento e interação entre os agentes.

Em agosto de 2012, o governo federal anunciou o Programa de Investimentos em Logística (PIL), com a previsão de R$ 133 bilhões em investimentos, sendo que a maior parte deles – R$ 91 bilhões – seriam direcionados às ferrovias e o restante às rodovias. Dois anos depois do anúncio, foram licitados seis lotes de rodovias – que somam 4,8 mil quilômetros em trechos que interligam o Sudeste e o Centro-Oeste e irão contemplar R$ 32 bilhões de investimentos ao longo de 30 anos de duração dos contratos.

Novos trechos deverão ser licitados ao longo dos próximos meses. As concessões devem reduzir o peso da logística na planilha de diversos setores. Estradas em más condições podem representar alta adicional de 30% no custo operacional de caminhões, por conta de desgaste nos pneus, reposição de peças e maior gasto com diesel. Levando-se em conta o deságio das licitações, que chegou a cerca de 50%, a cobrança de pedágio deve representar uma alta de 12% no bolso dos caminhoneiros, mas, como as estradas estarão em melhores condições, os custos operacionais terão peso menor.

“Essa diferença de 18% entre o custo operacional e o pedágio irá direto para o bolso do transportador”, destaca Paulo Resende, professor da Fundação Dom Cabral (FDC). Estudo da FDC realizado no ano de 2012 apontava que o custo logístico consumia 13,1% da receita bruta das empresas consultadas, cujo faturamento superava R$ 1 trilhão. Por conta do desequilíbrio da matriz de transporte (as rodovias respondem por mais da metade da circulação de mercadorias no país), cerca de 45% desse custo estava relacionado ao transporte de longa distância feito pelas rodovias.

“Então esses 18% cairiam sobre esses 45%, o que pode representar uma queda de 0,7 ponto percentual sobre o custo total logístico, que cairia para 12,4%”, afirma o especialista, ressaltando que a economia pode chegar a R$ 10 bilhões anuais.

A melhoria da BR-163, entre o Centro-Oeste e o Norte, está abrindo um novo horizonte para os produtores da região. Recentemente, a Bunge inaugurou uma nova rota de exportação, com a abertura de terminais portuários nas cidades paraenses de Miritituba e Barcarena, o que possibilita o uso da hidrovia Tapajós-Amazonas. A navegação pelo rio vai eliminar mais de três mil viagens de caminhões por mês, que antes levavam os grãos do Centro-Oeste aos portos das regiões Sul e Sudeste.

“Há outros investimentos sendo feitos por diversas empresas, com potencial de transportar 20 milhões de toneladas em cinco anos, criando uma rota alternativa”, observa Ricardo Tomczyk, presidente da Aprosoja-MT. A cabotagem também tem sido uma outra opção cada vez mais estudada pelas empresas. No setor de vendas diretas, as fabricantes de cosméticos já estão enviando produtos do Sudeste para o Nordeste e o Norte.

A Herbalife estuda iniciar testes com a cabotagem no próximo ano, na rota entre o Sudeste e os portos de Suape (Pernambuco) e Salvador (Bahia) e o porto de Manaus, no Amazonas. “Os custos estão se tornando muito competitivos, uma barreira ainda é a questão da pontualidade, mas o transporte marítimo tem tido uma disponibilidade maior, enquanto o rodoviário é bastante vulnerável e sempre pode trazer surpresas em relação a prazos, dependendo de condições climáticas ou das rodovias”, afirma Ricardo Romano, diretor sênior de finanças e operações ao distribuidor independente da empresa.

Em comparação a países que também têm grande extensão territorial, o Brasil conta com uma matriz de transportes desequilibrada. Nos EUA, 43% da circulação de cargas é feita por ferrovias e 32% pelas estradas, enquanto na China 50% é feita pelas rodovias e 37% por trilhos. No Brasil, quase 60% das cargas trafegam sobre rodas, sendo que apenas 13,5% de todas as estradas existentes no país são pavimentadas. O excessivo peso do transporte rodoviário é sentido no bolso. Os custos logísticos hoje chegam a 10,6% do PIB, um número quase 50% mais alto do que os 7,7% verificados nos EUA. Para mudar esse quadro, será preciso que o modal ferroviário ganhe espaço.

Nos próximos dez anos, a malha férrea pode passar por uma revolução. Hoje cerca de três mil quilômetros estão sendo construídos, o que deve ampliar a densidade do modal, que receberá uma interligação entre as regiões Norte e Sul e ainda terá um braço na região Nordeste. As ferrovias respondem por um quarto da circulação de mercadorias no país. “O modal ganhará maior relevância com as obras em construção e com as concessões que estão sendo planejadas, aí poderemos ver uma matriz mais equilibrada e cargas, como cimento, produtos siderúrgicos e grãos, sendo ainda mais transportados pelos trilhos”, diz o presidente da Associação Nacional dos Transportes Ferroviários (ANTF), Gustavo Bambini.

Fonte: Valor Econômico